2 de janeiro de 2008

O que fazer para evitar tantas mortes no trânsito brasileiro?

Achei excelente esse artigo da jornalista Ruth Aquino que saiu na Epoca depois do Natal.
Reproduzi abaixo.

Punir é uma forma de educar

Tem gente que passa o natal engordando, relaxando e trocando presentes. Neste Natal, 196 brasileiros passaram o feriado morrendo nas estradas federais, em destroços de carros, caminhões, ônibus e carretas. Os feridos são 1.870. Em vez de degustar ceias e presentes, dezenas de famílias conheceram o luto. O total de mortos pode dobrar, porque a estatística não registra quem morreu nos hospitais. Mais um recorde macabro, e ainda não passamos pelo Réveillon ou Carnaval.
O que fazer? Punir. Aplicar a lei. Aumentar o valor das multas. Não mudar o Código de Trânsito em favor dos infratores. Prender os motoristas irresponsáveis. Suspender a carteira. Não chamar de acidente já ajudaria, diz Rodolfo Rizzotto, coordenador do SOS Estradas: “Acidente é cair um meteoro na cabeça do motorista. Desastres são todos previsíveis”. Especialistas já se cansaram de elaborar listas de causas. O professor Paulo Fleury, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), diz o que nós já sabemos: “As mortes no trânsito não são uma epidemia cuja causa não se sabe. Ao contrário: se sabe a causa, o lugar, o motivo. É descaso das autoridades”. A legislação brasileira não obriga ninguém a soprar no bafômetro. Permite uma série de recursos a quem mata no trânsito. Não há provavelmente ninguém preso ou com habilitação suspensa por ter matado uma pessoa ou uma família inteira na rua ou na estrada. O que são “cestas básicas” como punição para assassinos no trânsito? O Brasil conseguiu a proeza de afrouxar seu Código. Antes, pela lei, o motorista teria a carteira suspensa se fosse flagrado dirigindo 20% acima do limite de velocidade. No ano passado, esse índice subiu para 50%. Uma nova resolução do Contran determina que os radares sejam sinalizados e anunciados nas estradas. Só no Brasil mesmo. O que se faz entre os radares? Acelera-se. Nem o mau estado das rodovias pode levar a culpa: 80,7% dos acidentes acontecem em asfalto em boas condições; 71,4% em retas. Imprudência, álcool e impunidade são os maiores vilões. Isso soa terrivelmente redundante.

Motoristas não têm a menor educação. Talvez fossem mais polidos se, na escola, ao ser alfabetizados, aprendessem noções de cidadania. “Primeiro é preciso multar todos os pais que param em fila dupla na frente das escolas”, diz Rizzotto. O mau exemplo, dos pais, é a pior aula de direção irresponsável para a criança. Na Inglaterra e na Alemanha, carros param para pedestres, mesmo fora do sinal. No Brasil, motoristas aceleram no sinal amarelo, e alguns “brincam” de assustar o pedestre. Não existe uma meta nem se aprende com o que aconteceu. A perícia vai para a gaveta. Há pesquisas associando acidentes ao cansaço. Em países civilizados, já soa um alarme em veículos a cada duas horas de direção. Uso de celular, rádio alto, excesso de horas, viagens depois de trabalhar o dia inteiro – tudo isso causa acidentes. Celular agora dá até dois anos de cadeia... na Inglaterra. No Natal, um amigo de meu filho de 20 anos contou que sua maneira de dirigir mudou na Austrália. “Se bebo, não dirijo. Se dirijo, não bebo. Aprendi isso lá. Se me pegassem dirigindo alcoolizado, mesmo sem provocar acidente algum, eu ia para a corte, perdia a carteira e, se reincidisse, era deportado.” Por que não há o mínimo rigor no Brasil?

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